sexta-feira, 6 de julho de 2012

Caixa de Pandora

"Não abra".

Tá lá, claro e transparente. Escrito em vermelho em uma etiquetinha branca por algum profeta cego desses tantos. Ali, tá vendo? Na tampa. Ah... a tampa. Bonitinha, a tampa, né? Será que abre? Opa, abre -- nem tranca tem. Tá só fechadinha, assim, como quem não quer nada. Mas tem a tal etiquetinha e... O que tava escrito mesmo? Ah, sim, isso --

"Não abra".

E aí você levanta a tampa. Levanta a tampa e se choca. Se choca e resmunga. Resmunga e culpa Deus e o mundo porque ninguém te avisou, porque era uma cilada, porque, porque... Porque você ignorou o aviso, capiau -- e só. Mas o fato é que você fez apenas o que foi projetado para fazer.  Porque ser humano é um bicho burro por design, geneticamente programado com algum cromossomo falho que o faz naturalmente incapaz de processar o significado dos caracteres "N", "Ã" e "O" concatenados. Ou talvez até tenha a tal habilidade -- só não a exercita com frequência. Porque é curioso e, sendo curioso, quer saber o que tem dentro de toda e qualquer caixa. Mesmo que não seja capaz de encarar o que tem ali dentro. Mesmo que a caixa não seja dele. 

Mas a história não termina aí: Você sempre resolve voltar atrás e fechar a tampa. Só que fechar a tampa não te faz esquecer o que você já viu lá dentro; já foi. Você está mudado, irremediavelmente mudado, mesmo que seja só de um sujeito que não sabia o que tinha dentro da caixa para um sujeito que agora sabe o que tem dentro da caixa. Mas conhecimento nunca muda a gente para pior, né? Enriquece a pessoa, e tal, e tal. Se você acredita nisso, pare para pensar sobre como você era feliz quando ainda achava que Papai Noel existia, ou quando achava que a coisa mais difícil do mundo era a prova de Matemática da terceira série. Você não tinha que se preocupar com passar na entevista de emprego, com IPTU, com IPVA, com IPQP, com seguro, com abastecer o carro, com ter sucesso na carreira, com ter sucesso pessoal, com ter sucesso na rua, na chuva, na fazenda ou numa casinha de sapê. Pois é.


Mas convenhamos -- a culpa não é sua, que abriu a caixa (
nunca é). A culpa é da etiqueta. Não, melhor: A culpa é do profeta cego que escreveu a etiqueta. Ele não foi claro na mensagem, não enfatizou o suficiente. Pensando bem, agora, me atrevo a dizer que foi até mal intencionado -- deixando uma mensagem assim... tão ambígua, tão nebulosa. "Não abra" -- sacanagem deixar uma mensagem besta dessas. Ele não deveria nem ter usado uma "etiqueta", pra começar -- deveria ter usado um letreiro piscante em neon. Isso! Se quisesse mesmo ajudar exploradores desavisados, teria usado neon. Mas usou etiqueta. Então, a culpa é, obviamente, do profeta. 

"
Não abra."
(pisca)
"NÃO ABRA..."
(pisca)
"NÃO ABRA, PORRA!
(pisca)
(repete)

Quem abriria uma caixa com letreiro de neon? Ninguém, claro. Mas não tinha neon e, por isso, você foi lá e abriu. Não faz sentido se arrepender agora -- a gente pega o profeta um dia desses. Por agora, só resta dizer "tchau" para a ignorância confortável pré-caixa e se habituar à sua nova realidade pós-caixa. Sabendo o que não devia, o que não era para saber. Mas pelo menos você abriu a caixa -- melhor assim. Acho. 




9 comentários:

  1. Esse teu texto me pareceu o momento que estou vivendo hoje.
    Como pode? Você leu meus pensamentos?
    Adorei te ver de volta...adoreeeeeei ler mais um super texto teu...

    volta, volta definitivamente vai. :D

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  2. Pois é Fábio...e não é que eu abri uma caixa e fiquei sabendo o que não deveria (e vc sabe o que é, rsss). Me arrependo? Talvez. Eu era feliz (antes de abrir a caixa) e não sabia! Mas pensando bem, acho que sou feliz agora...Questão apenas de ponto de vista. Parabéns, voce continua o máximo nas letrinhas

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  3. Boa, Fábio! Texto super interessante! E passou-se um ano desde seu último texto, não foi? hehe
    Agora falando sobre o texto, realmente, as pessoas já GOSTAM de abrir a caixa com a etiqueta "Não abra.", mas ei, quem nunca abriu uma caixa dessas, né? hahaha. É da natureza humana, de fato.
    Abraço, meu brother. Se cuida. :)

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  4. Medo de saber que caixa era essa, Fabio Piva!

    Mas eu tenho uma teoria: conhecimento não é exatamente uma coisa que está aí pra todo mundo. Essa balela de "somos todos iguais" é, como eu já disse, uma balela.

    Então...o profeta vai lá e coloca a etiqueta: "Não abra!" Não que ele não queira que você, especificamente, abra a tal caixa. Ele sabe que só os escolhidos desobedeceriam a etiqueta. Todo o resto da humanidade dirá amém e o conhecimento continuará pertencendo só a alguns. Como ele proferiu. Como a gente já sabia. Você é agora um dos escolhidos.

    Tendeu?

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  5. Nem todos tem coragem de abrir a caixa. Tenho certeza que mesmo que estivesse colada nela uma etiqueta com aviso ao contrário, muita gente não teria coragem de abrir pois para muitos a zona de conforto é bem mais segura e comoda. Todos sabem que uma nova descoberta, um novo aprendizado, um passo a mais no amadurecimento vai obriga-lo a mudar, a agir, a sair da zona de conforto e alguns não querem isso.
    Eu prefiro arriscar sempre e acho que vc tb, por isso nos presenteia com textos como esse que esfregam na cara de muitos o que eles se recusam a enxergam.
    Adorei!!!!

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  6. É o proibido que sempre atrai... é... nós sabemos...
    Escreva mais, todos sentem saudades!!
    Beijo, beijo!!!
    Edi.

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  7. Fabio, que bela surpresa meu querido!!!!
    Fico feliz e orgulhosa....sim orgulhosa mesmo....pois você se tornou um belo "escritor"....pra que te ensinou o beabá....lembra...Tia Re, não consigo fazer essa letra?!!!!
    Parabéns meu querido!
    Beijão
    Kathia - Tia Rê

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  8. AE, FINALMENTE!!!! Volta a escrever!! Depois me explica o que quis dizer com esse texto. Feliz de ter você de volta por aqui.
    Beijôncio.

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  9. Pare de ler/advinhar meus pensamentos, palavras e obras. Sem mais. Att.

    Cara, que saudade eu tenho de você escrevendo.

    Beijos, primo!

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