sexta-feira, 29 de outubro de 2010
Mudança
sexta-feira, 22 de outubro de 2010
Nece... o que?
Celular toca. Toca. Toca. Ignoro – o metro e meio que me separam do aparelho não podem ser cobertos pelo meu braço, por mais que eu me esforce em esticá-lo [motivo pelo qual a cerveja se encontra a quarenta centímetros de mim]. “Se fosse importante ligariam em casa”, penso. Telefone de casa toca – saco.
sexta-feira, 15 de outubro de 2010
Herdeiros do amanhã
Ah, enfim chegou o Dia das Crianças. Data mais linda, em que celebramos a inocência e a pureza dos pequenos pimpolhos que nos trazem tanta encheção de saco alegria – e que nos mostram que a vida ainda vale a pena, que o mundo ainda não está completamente perdido. E quem nunca sorriu bobamente ao presenciar um destes projetinhos de seres humanos protagonizando alguma fofurinha indescritível, é porque tem o coração gelado e está irremediavelmente morto por dentro. E estes, em geral, exercitam sua frieza e insensibilidade escrevendo textos cínicos sobre as criancinhas, em plena semana do Dia das Crianças – o que eu, particularmente, considero um absurdo inominável.
Sim, porque nenhum adulto em sã consciência deveria ser capaz de não gostar de crianças. Ok, ok, elas são barulhentas, relativamente indomesticáveis, melequentas, birrentas e em geral não cheiram bem – mas nada disso se compara à alegria que trazem àqueles que convivem à sua volta. Os fabricantes pais que o digam – pois a cada brincadeira ou peripécia, estes experimentam a mais saudável sensação de plenitude que se é possível experimentar na vida. Pobres daqueles solitários adultos que nunca experimentarão, por opção ou falta dela, este sublime sentimento que é ser pai: Ter um monstrinho pequerrucho para chamar de seu – não há objetivo de vida mais nobre do que este, suponho.
Mas infelizmente, ainda não fui agraciado com uma pessoinha-mirim para adestrar segundo meus próprios valores. E sei que ninguém sensato abriria mão de contribuir para a superpopulação global com mais um indivíduo, posto que é exatamente isso que a sociedade espera de nós “enquanto cidadãos”. Este mundo lindo, perfeito e justo em que vivemos deveria ser aproveitado ao máximo – se não por nós, por nossas crias. E se não por elas, por suas crias – e assim sucessivamente. E assim, de geração em geração, a Humanidade vai passando para a frente a responsabilidade da restituição de valores de que as gerações anteriores se esqueceram, descuido este que faz do nosso mundo um cenário menos lindo do que foi o mundo dos nossos antepassados. Salvadores – a maioria das pessoas enxerga em seus próprios filhos salvadores de tudo o que houve de mais belo. Mas se esquecem que, um dia, eles também foram vistos como os messias da sua época – e muito provavelmente falharam em sua tarefa de resgatar o mundo das atrocidades de outrora. E dessa forma, não lhes resta outra opção além de espalhar sementinhas de esperança pelo mundo, pois – essas sim – serão capazes de reverter a famigerada inércia apocalíptica que nos arrasta para um irremediável e doloroso fim dos tempos.
Por isso, me desculpem se, ano após ano, tenho menos esperanças quanto à nossa permanência indeterminada, enquanto espécie, nesse mundão lindo de meu Deus. Não é inconformismo, é apenas discordância declarada do senso comum – recuso-me a pensar na nossa juventude como “o futuro da nação”, ou como “os herdeiros do planeta”, ou ainda como “a geração de Aquário”. Atribuir tamanha responsabilidade a quem acabou de chegar nessa balbúrdia, quando nem mesmo nós – os protagonistas vigentes dessa pecinha terrena – fomos capazes de contribuir para o melhor espetáculo possível, me parece no mínimo insensatez comodista. E confesso que me sinto mais orgulhoso ao ver um velhinho reciclando lixo, ou uma senhora na meia idade auxiliando o próximo, do que quando presencio o nascimento de uma nova “semente de esperança” – trazida a um mundo torto por adultos tortos, que acreditam que sua contribuição para a sociedade já foi concluída com a produção daquele pequeno “herói do amanhã” que acaba de receber a dádiva da vida. “Mas eu nasci para ser mãe...” – compreendo, mas sinto que já temos exemplares demais de parideiras. Estamos em escassez de “Quero fazer a diferença antes de morrer” e de “Eu queria ter filhos, mas antes há muita coisa a consertar”.
Chances – todos temos chances incontáveis de melhorar o mundo com nossa curta passagem por essas bandas. Pode ser uma contribuição mínima, ou algo mais impactante – pouco importa, na verdade. A grande questão é que acomodar-se na posição de produtor de seres humanos, na esperança de que estes façam todo o trabalho sujo por você, não me parece a melhor forma de aproveitar sua estadia no nosso planetinha tão acolhedor. E papais e mamães, de uma vez por todas: Gente que não tem filhos não é – compreendam de uma vez – digna da sua pena. Não somos pobres seres humanos incompletos que abriram mão da dádiva do Senhor em nome de um estilo de vida hedonista – não todos, ao menos. Muitos de nós, na verdade, nos fazemos muito mais plenos do que vocês – e preferimos tentar botar alguma ordem na casa antes de trazer novos visitantes por aqui. Teremos tempo? Possivelmente não. Mas ao menos temos a consciência de que a bagunça é nossa e portanto é também nossa a responsabilidade de tentar fazer do mundo um lugar minimamente apresentável – ainda que, neste caso, para os seus filhos. Não nos agradeçam – apenas nos poupem da sua piedade progenitora cega.
E assim concluo minha pequena homenagem à molecada. E ao invés de exigir que se façam mais competentes do que nós enquanto guardiões do mundo, sugiro apenas que se divirtam em sua passagem por aqui. Se conseguirem fazê-lo sem interferir negativamente na diversão dos coleguinhas, ótimo. Se forem capazes de reverter o cenário hediondo que só piorou com a visita dos seus papais e mamães, tanto melhor. Mas não espero que tenham sucesso na empreitada, nem que se crucifiquem por não conseguirem salvar o mundo. Nós também não conseguimos.
sexta-feira, 8 de outubro de 2010
Virtualices
Você abre a geladeira e procura uma latinha de cerveja. Como na maioria das vezes, você não encontra [as cervejas têm o estranho hábito de se ausentarem quando se fazem mais necessárias], mas isso não é problema: Basta fechar a porta, digitar “cerveja” no painelzinho futurista que se apresenta na sua frente e aguardar o moço da entrega lhe trazer um engradado do néctar dos deuses. Legal? Certamente. Ficção científica? Já foi – os primeiros protótipos de geladeiras interativas já estão dando as caras por aí. Bizarro? Sem sombra de dúvidas. Mas bizarro ou não, a cerveja chega rápido e meu fígado impaciente agradece.
Há cerca de quinze anos, bizarros eram os poucos computadores pessoais que traziam a estranha habilidade de se conectar ao mundo através dessa tal de Internet. Ainda me lembro nitidamente daquele som característico, que lembrava o desespero de um gato enclausurado em uma panela de pressão, que o modem fazia ao TENTAR me ligar ao mundo – tentava, tentava e muitas vezes desistia. Mas quando conseguia, me permitia passar noites em claro conversando com meus outros dois ou três amiguinhos que também tinham Internet – tudo pelo ICQ, mIRC ou chat da UOL. Não existiam Orkut, Twitter, MSN, Webcam, Facebook, FarmVille, blogs ou sei-lá-o-que-mais. Eram, portanto, tempos menos modernos e mais simples.
Hoje, as comunidades virtuais dominam o mundo. E mesmo que você vista uma boina, deixe a barba por fazer e assuma uma postura de “Che Guevara de boutique” – e se recuse a ter Orkut ou algo que o valha – sinto informar: Você está aqui agora, lendo este texto que foi escrito por alguém que nunca viu e provavelmente mora em outra parte do planeta. E assim, você não se encontra em uma situação assim tão distinta daqueles que passam os dias cultivando alfaces em suas fazendinhas virtuais, nem daqueles que bebem com os amigos avatares no Twitter às sextas à noite – quando poderiam estar em bares reais, acompanhados por pessoas reais. Você também poderia estar lendo um livro real – mas está aqui comigo, não está? Pois então – somos escravos do mesmo Deus de mentirinha, criado por bits e bytes e adorado por seguidores que se disfarçam de JPEGs. Resistir é inútil – mas se você ainda quiser tentar, acesse o ReclameAqui.com e acrescente seus pensamentos ao banco de dados.
É interessante pensar que muita gente substitui uma parcela considerável da vida real por essa tal de virtualidade. Há inclusive aqueles que preferem sua vida social virtual à real, e trocam noitadas tradicionais por algumas horas a mais na frente do computador. Confesso que não posso culpá-los: Me parece muito mais confortável passar a noite cercado por janelinhas e letrinhas, ao som dos meus MP3s prediletos, do que passar a mesma noite cercado por gente de carne e osso desinteressante e conversas insípidas, ouvindo algum batuque moderno desses que não me agradam nada. O mundo virtual também me permite encher a cara sem medo das batidas policias na volta para casa, fumar em local fechado – minha sala de estar – e encerrar conversas desagradáveis com um leve movimento de dedos. O mundo real, por outro lado, me garante uma ou outra experiência física válida [dentre tantas outras frustrantes], me obriga a vestir camisa e a trajar algo menos confortável que meu short azul-marinho de algodão. A concorrência é desleal.
E aí vem aqueles japoneses malucos sujeitos extremistas dizendo que é possível se apaixonar online. Hoje, é cada vez mais comum gente que se casa sem ter nunca sequer encontrado o(a) noivo(a). Acho lindo – longe de mim condenar qualquer forma de amor, ainda mais uma assim tão moderna e tecnológica. Mas vem cá, convenhamos... como DIABOS alguém se apaixona por um bando de letrinhas e imagens de vídeo, um personagem criado por outro alguém sentado do outro lado da tela? Como é que alguém tira o retrato do ser amado de cima do criado mudo, e coloca um bitmap no lugar? Cheiro, gosto, presença – sempre acreditei serem componentes cruciais para o envolvimento emocional, mas talvez sejam apenas meros detalhes. E o Admirável Mundo Novo não se atém a detalhes – prefere se ater a ideais. Relacionamentos criados a partir de ideais: Acho esquisito. Há quem diga que é possível, mas até aí tem louco pra tudo nesse mundo.
Vivemos em tempos estranhos, não há dúvidas disso. O mundo lá fora continua, talvez, tão convidativo quanto antes – mas nunca tinha encontrado competição à altura até agora. “A realidade é melhor que qualquer ilusão” – poucos contestariam. Mas mesmo a realidade sempre exigiu um certo faz-de-conta, um fingimentozinho básico de quem a idolatra: Trabalhar cedo fingindo bom humor matinal, esconder aquela espinha teimosa com maquiagem, evitar de mandar o chefe à merda quando é só o que nos passa pela cabeça, balançar assertivamente a cabeça enquanto se ouve uma história maçante proferida por algum amigo... Avatares que só podem ser desconectados fora do horário comercial, quando chegamos em casa e nos encontramos entre quatro paredes. E é precisamente neste momento que nos sentamos confortavelmente à frente do PC e buscamos nas janelinhas digitais o alívio para essa virtualidade analógica que fica retida do lado de lá da porta. Confuso? Talvez. Mas não é minha culpa se ninguém escreveu ainda um software para simplificar o mundo.
sexta-feira, 1 de outubro de 2010
Um conselho...
Um dia desses fui abordado por um amigo desesperado por uma opinião externa para resolver um problema pessoal. “Tô precisando de uns conselhos, cara” – esta foi a sentença utilizada pelo moço que, em um momento ínfimo de distração minha, conseguiu o que buscava: Alguém que se dispusesse a resolver – ou ao menos a tentar resolver – o problema que incomodava sua pobre alma aflita. Horas se passaram entre explicações e detalhes de uma história sórdida que nem era minha, mas que eu ouvia atentamente na esperança de manufaturar um conselho minimamente aproveitável. E quando finalmente fui capaz de expressar um parecer sobre a odisséia emocional que meu interlocutor enfrentava, veio a reação inesperada: “É... vou pensar... valeu.”
Ao ser agraciado com este eloquente agradecimento, pude notar que eu não havia ajudado em absolutamente nada meu infeliz amigo. E não havia sido por falta de esforço – eu havia escutado a história, havia me colocado no lugar daquele ser confuso, havia tecido pensamentos e ponderado soluções. Havia, enfim, exercitado minha curta paciência, na esperança de auxiliar o próximo – e tudo em vão. E foi então que cheguei a uma conclusão quase óbvia: Conselhos são, em essência, algumas dessas tantas coisinhas inúteis inventadas pelo bicho homem – e sem as quais ele não consegue, no entanto, viver.
Pensemos friamente – afinal todos já nos vimos desesperados por algum desses simpáticos palpites alheios: Em primeiro lugar, o problema é – seja qual for ele – única e exclusivamente seu. Este fato, por si só, já deveria desanimar qualquer requisição por intervenção externa – pois só você, o pobre sofredor, conhece todas as nuances do quebra-cabeças que tenta montar. E se nem você, que já está ali imerso em pecinhas há nem-sei-quantos dias, sabe qual é a que está faltando, imagine então o conselheiro que está chegando agora para brincar. “Ah, mas um olhar de fora pode enxergar algo que está ali na minha frente e eu não vi...”, você diz. Neste caso, insisto: Você não precisa de conselhos – precisa prestar mais atenção em sua própria baderna e, no pior dos casos, de óculos.
Segundo: Mesmo na animadora hipótese de você ser um contador e tanto de histórias, e do ouvinte ter uma concentração digna de um monge tibetano, as chances são de que ele vai, em algum momento durante a sua exposição, parar de prestar atenção nas suas lamúrias. Eu sei que dói, mas a verdade é que problemas todos nós temos. Assim, seria prepotência sua imaginar que seu conselheiro não está, enquanto lê seu relato trágico no MSN, pagando alguma conta atrasada ou pensando em uma forma de escapar à sua carência – possivelmente com o intuito compreensível de buscar soluções para suas próprias aflições. E dessa forma, é muito possível que ele perderá algum detalhe crucial – ou que você considere crucial – para a elaboração de um conselho adequado (supondo, otimistamente, que estes sequer existam).
Terceiro, mas não menos importante: Se seu problema é cabeludo o suficiente para que você dispare o bat-sinal em busca de um herói anônimo – ninguém busca conselhos sobre qual é a melhor marca de cerveja ou sobre onde almoçar numa quarta-feira – você corre o sério risco de se tornar assunto da próxima reunião da turma a que você deixar de ir. “Ah, mas meu conselheiro é leal e jamais participaria outros dos meus problemas...” – tá, vamos seguir por esta linha, então. Seu amigo pode ser tão leal, mas tão leal, que seu problema cabeludo disperte-lhe o interesse e se torne, portanto, problema dele também. E nesse caso – sim, você adivinhou! – ele vai buscar conselhos com os próprios amiguinhos. E estes, sendo também muito leais, buscarão pareceres cada vez mais externos. Entendeu? Então uma extensão de pensamento: Quanto mais cabeludo o seu problema, e quanto mais leais aqueles a quem você busca na hora do desespero, maiores são as chances de você se tornar um palhacinho de um circo que você mesmo armou.
Portanto, deixo aqui um conselho uma sugestão: Pedir conselhos é aconselhável somente se falar dos seus problemas lhe traz algum conforto. Da mesma forma, dar conselhos é um ato louvável – desde que você não se importe de gastar sua saliva e seu tempo em uma atividade que, possivelmente, não trará nenhum benefício concreto ao solicitante. E por fim, conselhos em si, enquanto artefatos de solidariedade, são completamente dispensáveis. Tenho certeza que alguma estatística por aí comprova que existem muito mais conselhos descartáveis do que aproveitáveis. E assim sendo, como todo serviço mal executado que se preze, a melhor solução é cobrar – e cobrar caro – por eles. Assim, você se protege “enquanto prestador” – recebendo algum dividendo pela atividade exercida – e também “enquanto consumidor” – pois poderá ao menos acessar o PROCON, no caso provável de algum palpite alheio piorar a sua situação que já não era boa no princípio.
Antes de concluirmos, anote aí, como cortesia: “Se conselho fosse bom, a gente não dava – vendia”, já dizia o ditado. Talvez este seja um desses raros – e gratuitos – bons conselhos. Ou talvez não, não sei. De qualquer forma, utilize-o com moderação – o Paciência Negativa não se responsabiliza por eventuais danos que o mau uso de conselhos possa causar. Mas se a empreitada comercial der resultado em capital bruto, eu quero participação nos lucros.