sexta-feira, 9 de julho de 2010

Expectativa e decepção

Não sei exatamente como começar este texto, e nem qual será o tom final. Sei apenas sobre o que quero escrever hoje, e também que não estou para piadinhas. Por isso, se você veio aqui procurando o humor ácido de sempre, talvez este seja um bom momento para parar a leitura e ir a um site de quadrinhos, ou assistir ao programa do Datena, ou a qualquer outro programa humorístico do gênero. Aliás, minto: Se você veio aqui esperando qualquer coisa, talvez seja o melhor dos motivos para prosseguir com a leitura. Vamos adiante.

Criar expectativas: Habilidade primordial do ser humano, nossa maior bênção e também nossa maior maldição. O ser humano é o único bicho do mundo que especializou-se, através de um longo e turbulento processo evolutivo, em esperar alguma coisa, sempre, de tudo e de todos. E talvez devamos a isso mesmo o “avançado” estágio em que se encontra a Humanidade. Invenções, descobertas tecnológicas e tudo o que chamamos de Ciência -- a jóia cultural máxima da nossa espécie -- só existem porque alguém, algum dia, criou alguma expectativa sobre alguma coisa, motivado por insatisfação extrema sobre a situação anterior à sua “Eureka!”. E até aí, tudo bem.

O problema é que este bichinho-homem, do qual nos orgulhamos tanto ser, tem uma insuportável mania de querer controlar até mesmo o incontrolável. E essa tal expectativa, que em algumas circunstâncias motivam tantos sucessos aclamáveis, acaba sendo a responsável única pela arqui-inimiga do indivíduo: a Decepção. Quem nunca se decepcionou com alguém, ou com alguma coisa, que atire a primeira pedra. Se não é uma entrevista de emprego que não teve retorno, é algum casinho que não ligou no dia seguinte. Somos perfeitamente capazes de nos chatearmos até mesmo ao acordar em um dia que deveria ter sido ensolarado -- e como poderia não ser!? -- mas teimou em amanhecer nublado. Guerras, brigas de casais, frustrações mil, relacionamentos que afundam -- tudo acontece porque alguém espera algo de alguém que falha em satisfazer. E não se engane: todos falhamos em satisfazer, em algum ponto.

Mas aí é que o caldo entorna: Nos decepcionamos quase com a mesma frequência com que respiramos. Mas ao invés de assumirmos as consequências de nossas próprias expectativas, muitas vezes mal direcionadas e fadadas ao fracasso, acabamos culpando o outro por, naquela situação específica, não ter feito aquilo que era a única coisa passível de ser feita, o óbvio ululante. Caro leitor, trago a você uma triste notícia: O responsável por suas decepções e expectativas insatisfeitas é, na imensa maioria dos casos, você. Você não deveria ter esperado tanto. Você não deveria ter vinculado a sua felicidade -- mesmo que momentânea -- àquele evento ou reação alheia completamente independente das suas vontades ou necessidades. Você, você, você.

Até o mais anti-social de nós é, em essência, um ser dependente de outros bichos-homens. E dessa forma, nascem os ídolos: Seres humanos intocáveis, desprovidos de falhas e incapazes de errar, trair ou frustrar. Gente como a gente, mas que insistimos em colocar em um pedestal, como se fossem instâncias melhor acabadas da espécie humana. E é extremamente comum nos depararmos com gente resmungando porque algum desses semi-deuses cometeu alguma barbaridade inominável, algum pecado máximo que somente um reles mortal cometeria. E se decepcionam, choram, clamam pela recuperação daquela imagem imaculada que tinham criado. Destes, tenho pena: Querido egocêntrico, bem feito. Ninguém mandou você achar que o mundo é um palquinho sob sua direção, em que os demais seres humanos atuam na sua peça, regidos pelo seu roteiro escrito a punho-de-ferro. A regra é cristalina: Espere menos dos outros, e você se decepcionará menos. Espere demais, e prepare-se para uma vida repleta de frustrações. Só não me venha chorar as pitangas depois, porque eu, que não sou ídolo nem melhor que você, vou te mandar encher a paciência de outro infeliz.

Sendo este um texto atípico, tomo a liberdade de terminá-lo de forma igualmente atípica -- com uma dica direcionada apenas ao leitor que faz esse tipinho “espero que você não me decepcione”: As pessoas não tem bola de cristal. Ninguém vem ao mundo com o objetivo único de adivinhar tudo aquilo que você espera, e mesmo que adivinhassem, não teriam nenhuma obrigação de concordar com os seus ideais -- que até onde sei, são tão bons e tão falhos quanto os meus próprios. E se você discorda de tudo o que está escrito aqui, te respeito -- porque EU não tinha nenhuma expectativa de que acontecesse de outra forma. Já você... bem, suponho que meus pensamentos sejam apenas mais um adendo à sua interminável lista de expectativas insatisfeitas. Beijos e boa sorte com o mundo lá fora -- você vai precisar.



9 comentários:

  1. Não querendo ser repetitiva, mas já sendo Parabéns!! quem disse que acordar para a realidade é fácil? Concordo com você! beijoss e até o próximo post!

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  2. Nossa... pensei "n" coisas durante a leitura...
    Expectativas demais frustram mesmo...
    Ótimo texto!!!!!
    Beijão e saudades docê no TT
    Edilene

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  3. OMG este texto foi incrível, Fabio!
    Deu vontade de imprimir e distribuir pra mta gente... e de colar num lugar onde eu possa ler sempre.

    Congratulations... sem querer a gente tb espera algo qdo vem aqui ler os textos e vc se superou.

    Hasta luego da Lu q está em Buenos Aires

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  4. Pois é! Quantas vezes já estive nessa situação de esperar demais das coisas/pessoas e acabar me frustrando... Ou pior: as pessoas esperarem demais de mim, achando q eu não sou humana o suficiente para "errar" (no caso nem é erro, é o meu jeito de ser e a pessoa espera q eu seja do jeito q ela quer e acha certo ser... ah vá!)
    Mas concordo e assumo a culpa qdo me decepciono. Eu espero demais, crio expectativas demais e me decepciono, oras. Culpa minha! E aprendo cada vez mais com isso, pq qdo vou passar por uma situação semelhante, vou com menos sede ao pote, vou ciente da possibilidade de algo dar errado. Vou cada vez mais forte.
    Mas sempre, no auge da ansiedade, acabo metendo os pés pelas mãos e, ih! lá vem a expectativa feroz e galopante de novo!
    Normal! Sou humana, e como se decepcionar é comum entre os humanos, eu me decepciono sim, mas é coisa passageira, afinal não posso viver a vida sendo levada pela maré. Tenho q almejar alguma coisa! É emocionante! E emoção é bom pra dar uma chacoalhada no ser humano, fazê-lo se sentir vivo, capaz, motivado... Ainda q nade, nade, nade e morra na praia.

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  5. Perfeito o texto, muito bom. Ainda estou aprendendo a não criar expectativas sobre o incontrolável. Cada decepção é um tiro no pé, rs. É um caminho duro, mas necessário, e um passo importante pra felicidade e seja lá o que vier depois dela. Parabéns meu!

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  6. Mesmo acostumada ao "humor ácido de sempre" o texto foi muito bom. É até meio difícil de me fazer ler blogs,mas me chama atenção textos como os seus que realmente descrevem a realidade e concordo bastante com o que você pensa. Expectativas sim são boas,a vida é tão sem graça sem elas,viver sem almejar algo é tão vazio. Mas, realmente estamos sujeitos a sofrer decepções com essas expectativas criadas como também elas podem dar certo.É um risco que vale a pena correr.

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  7. Há, quando era mais nova, sempre esperei demais das pessoas... Até que um dia eu levei uns tombos pra aprender que as pessoas não têm obrigação nenhuma comigo... Mas o tombo não foi suficiente, eu levei outros, e outros...

    Hoje, com 27 anos, é que aprendi essa lição. E por isso digo: obrigado meu Deus, por eu não ter mais 15 anos, nem 16, 17...

    Não troco a minha maturidade de hoje por nada desse mundo!
    E minha vida é mais tranqüila... Não espero nada de ninguém, o que vier é lucro!

    Sou sua fã!

    Vanessa Pinho
    www.mulherices.com.br

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  8. Decepção não mata, ensina a viver!

    Nunca esperamos uma nova decepção, mas ela sempre acaba vindo. Isso nos torna mais maduros e espertos com a vida. =)
    É isso aí, Fábio. Excelente.

    Beijo

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