sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Amizades for dummies


SIM – eu sou anti-social. Até demais, diga-se de passagem. Mas sendo anti-social, prezo demais as minhas pouquíssimas amizades. E por essa razão (e por tantas outras que não convém relatar aqui), me considero em posição favorável para palpitar a respeito de uma das mais pseudo-valorizadas dádivas da sociedade: A amizade. E a amizade, diga-se de passagem, é algo valioso – mas quando mal aplicada, pode ser facilmente confundida com pentelhice. E você não quer ser um pentelho de carteirinha, quer, caro leitor? Imaginei.

Sim, eu disse que a amizade é pseudo-valorizada. Porque todo mundo prega por aí que amigo é coisa pra se guardar, mas a verdade é que ninguém guarda direito – e os poucos que tentam, guardam tão bem que não se lembram depois onde foi que colocaram. Sim, amigo é mesmo coisa para se guardar. Mas debaixo de sete chaves, só o que você não usa frequentemente – porque ninguém quer ficar destrancando uma porção de fechaduras para ter acesso a alguma coisa que faz falta no dia a dia. Assim, melhor mesmo é guardar na estante ou numa gaveta que não pegue muita poeira – algum local protegido, mas que facilite o acesso nos momentos mais importantes, bons ou ruins. Pelo menos é isso que eu procuro fazer com os meus.

Então vamos lá: Desbanquemos algumas falácias bradadas pelos quatro cantos do mundo sobre as amizades. Talvez você já saiba de tudo que eu estou prestes a expor aqui, ou talvez não. De qualquer forma, espero ser capaz de lançar luz sobre alguns pontos que considero fundamentais nestas estranhas relações sociais que se estabelecem entre duas ou mais pessoas, que se juntam para compartilhar tudo o que a vida traz de melhor e pior. Bem, prossigamos.

Em primeiro lugar, amigo não é aquele cara que está sempre lá para você. Ahn? O que? É isso mesmo. Seu amigo querido é, antes de qualquer coisa, uma pessoa – a menos que seja um bicho de pelúcia ou boneca e pano, mas isso foge da normalidade do escopo deste texto. E sendo uma pessoa, seu amigo tem – sim, você advinhou! – uma vida própria. E essa vida é também repleta de problemas, assim como a sua. Portanto, seu amigo pode não estar sempre disponível para te escutar choramingar ou trazer soluções para as situações bizarras nas quais você mesmo se meteu sozinho. E isso não faz dele um mau amigo, não senhor. Só faz dele um ser humano complexo como você mesmo. E se ele for um bom amigo, estará disponível sempre que possível – mas cabe a você compreender que isso não acontecerá sempre que você estalar os dedos. Sim, caro leitor – você também precisa ser um bom amigo para o seu bom amigo, e compreensão e respeito são fundamentais nesta empreitada. Nunca se esqueça disso. Tá anotando? Próxima lição.

Segundo, e não menos importante: Espaço. Gente precisa de espaço; amigo é gente; logo, por transitividade matemática, amigo precisa de espaço. CALMA – eu não vou começar a falar de matemática aqui: Só estou utilizando o vocabulário formal da disciplina-master para expor uma idéia que deveria ser óbvia. Às vezes, e tantas vezes, as pessoas – sejam elas suas amigas ou não – precisam passar um tempo acompanhadas exclusivamente por elas mesmas. Às vezes, a vida nos impõe momentos que só são plenamente aproveitados após uma reflexão auto-ostracista. E isso não significa que, se aquele seu amigo tão eloquente está passando um tempo longe das ferramentas de comunicação tradicionais, ele está te evitando – de maneira nenhuma. Talvez ele só esteja pensando na vida, revendo conceitos. E talvez ele precise fazer isso sozinho, antes de pedir seu auxílio para debater sobre as conclusões a que chegou consigo mesmo. Afastamento egoísta? Talvez. Mas o ser humano precisa ser egoísta, vez ou outra. Você também precisa ser – e é – egoísta vez ou outra. Respeite esta realidade imutável sobre a espécie e você viverá mais feliz e menos solitário – por mais contraditório que isso possa parecer.

Está acompanhando, querido leitor? Ah, que ótimo. Então, passemos à lição número três – que é apenas uma conjunção das anteriores: Amigos vivem. E viver, como você bem sabe, implica em cometer erros. E errar, como você aprendeu na escolinha, implica muitas vezes em mudar e machucar os outros. Mudar para pior? Nem sempre. Machucar os outros de propósito? Tampouco. O ponto é que viver é isso aí – pisar no calo de alguns enquanto tentamos evoluir e aprender. Esperar que seu amigo seja hoje a mesma pessoa que ele era há dez anos, quando você o conheceu, é surreal, frustrante e... bem, idiota. As pessoas mudam todos os dias, como consequência das experiências que elas vivem ao frequentarem esse mundão de meu Deus. E lembra? Seus amigos são pessoas.

Mas tudo bem, não se aflija – muitos de nós são providos de uma necessidade incontrolável de questionar, e compreender as razões por trás de cada passinho/mudança que seus amigos protagonizam na vida. Particularmente, não vejo nisso nenhum problema – basta que você procure conhecer a situação como um todo antes de formar opinião a respeito das atitudes dos seus fiéis escudeiros. Muitas vezes, você pode presenciar uma situação que envolve dois ou mais dos seus super-master-blaster-melhores amigos. E em geral, tal situação não lhe dirá respeito algum – mas tavez você seja um amigo tão bom, mas tão bom, que PRECISARÁ compreender o evento da melhor forma possível para auxiliar seus pares. Se você se enquadra neste perfil, seja sensato: Procure ser imparcial. Palpite, mas só quando lhe for solicitado. Forme opinião, mas apenas quando conhecer todos os fatos relevantes e versões sobre o ocorrido que for capaz de assimilar. Caso contrário, você não estará sendo um bom amigo – só um palpiteiro irritante que gosta de ver o circo pegar fogo. E esses, meu caro, ninguém gosta de ter por perto.

Por fim, mas não menos importante: Amigos de verdade não se afastam indefinidamente. Se você perdeu contato há tempos com alguém que lhe faz falta, procure-o. Talvez ele também sinta saudades de você. Talvez ele não tenha te esquecido, nem tenha deixado de apreciar sua companhia. Talvez ele esteja passando por um daqueles momentos auto-ostracistas explanados acima, ou talvez ele esteja precisando de um ombro amigo mas não saiba onde procurar. E é aí que você tem, caro leitor, a chance de mostrar como você pode ser um bom amigo para o seu bom amigo: Mostre-se disponível, mas sem invadir o espaço/privacidade do seu camarada. Se ele estiver precisando de você, estenda a mão. Se ele preferir ficar quietinho por mais algum tempo, respeite – ao invés de sair por aí bradando para todo mundo que fulano mudou e não se lembra mais dos amigos. Isso seria no mínimo uma atitude babaca desleal. E procure se lembrar de que você também já teve momentos em que precisou se afastar do mundo para resolver algum problema.

Guardem seus cadernos, larguem suas lapiseiras – por hoje é só. Espero ter sido capaz de esclarecer alguns pontos fundamentais para quem gosta de ser especial para alguém – seja esse alguém um bicho anti-social como eu, seja um alguém mais carismático. Tenho procurado aplicar estes conceitos no meu dia a dia, e não posso reclamar dos resultados. Não, eu não tenho tantos amigos assim. Mas dos que tenho não posso reclamar – e isso tem me sido mais que o suficiente. 


10 comentários:

  1. Já comentei esse post ontem, achei muito sincero... como tudo o que você escreve.

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  2. Como sempre, sua forma de pensar tão semelhante à minha.
    Já chego aqui sabendo que vou concordar com você, que louco isso.

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  3. E existem os amigos intensos, que apesar de algumas vezes se afastar, se intrometer onde não deve, de invadir a privacidade do amigo, de pentelhar e tudo, o sentimento que nutria pelo amigo não muda, pode quem sabe se confundir em meio de tantos outros sentimentos, e um desses outros seria a preocupação em tentar preservar o amigo que um dia vc já viu sofrendo e mesmo de forma errônea quer desesperadamente tentar evitar que aquilo se repita.
    Adorei o texto, vc como sempre dizendo de forma bonita e inteligente as verdades do mundo.

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  4. Olha, já está tudo anotado no meu caderninho tá? Mas usei caneta... rsrsrs

    Fato e certo, amizade é um trem gostoso mas tem gente que extrapola ou acha que podem ser donos do outro... coitados... E tem aqueles que te julgam sem nem ao menos ouvir o que vc tem a dizer, detesto estes e não me servem, muito obrigada.

    Beijo amigo!! ;)
    Edilene

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  5. Amigo é aquele que te dá espaço sem vc pedir. Amigo é aquele que sabe quando tem que se afastar, porque amizade demais enjoa. Tenho amigos que não vejo há anos, mas quando eu preciso, sei que posso contar com eles. Odeio amigo geléia, às vezes nem eu mesma me suporto.
    Bjos

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  6. Ah e tb tem os amigos planta que são aqueles que apenas decoram tua vida, sem fazer diferença nenhuma, sempre concordando com tudo aquilo que vc faz e fala, mas sem acrescentar nada de bom e os amigos de verdade que são os que as vezes discordam de vc, podem até brigar, fazer pirraça e tals, mas com certeza em algum momento da tua vida algum desses "erros" do teu amigo vão fazer diferença, nem que seja uma pequena palavra, um mísero gesto... Pq esse amigo é o que realmente gosta de vc, se preocupa e na platéia da vida torce por tua felicidade.

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  7. Ó eu não quero parecer puxa-saco, mas a verdade é que concordo com tudo o que vc disse nesse texto e acho que muita coisa vale também pra outros relacionamentos (pais e filhos, irmãos, namorados) muita gente se esquece de que todos são seres humanos.

    Nessas horas acho que esse blog devia ser bem mais visitado, tem uma porrada de gente por aí precisando ler isso.

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  8. Olha uma coisa que eu sempre pensei, o tal do espaço, incluindo nesse termo, algo mais profundo, o espaço de tempo. Cultivo amigos de infância, as vezes nos vemos 1 vez ao ano e sabe o que é mais legal? não importanta o quanto nos afestemos fisicamente, mas qdo juntos, a sensação é de que parece que foi ontem, sem melindres, sem cobranças e sem promessas...

    *** saudades de vc no meu blog ;)

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  9. Adorei, Fabio. Um dos melhores que eu já devo ter lido por aqui. E eu realmente gostaria de ter um amigo assim. Que soubesse (ou sentisse) a hora de me pentelhar pra saber o que tá acontecendo e a hora de me deixar quieta no meu quanto. Bom, no seu "tutorial" eu não acrescentaria mais nada, sem contar que eu - acho - que também sou uma dessas que preferem mais ficar no seu cantinho. Nem tenho palavras pra elogiar teu texto.

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